MEMÓRIAS À VOLTA DAS HISTÓRIAS EM QUADRINHOS (POR JOSÉ RUY) – 9

Quando me encontrava a trabalhar na Bertrand Editora, iniciou-se a publicação da revista Tintin em Portugal.

A selecção das histórias era cuidadosamente feita pelo Dinis Machado, e não só devido a esse critério, mas também pela qualidade do papel e da impressão, foi considerada pela Bélgica como a melhor publicação com o título Tintin, das muitas editadas em todo o mundo.

A colaboração de material português ao princípio era de umas páginas centrais, que depois foram ocupadas por originais de origem franco belga.

O Dinis Machado lutava para que houvesse uma presença de material nacional, e conseguiu criar um suplemento embora em papel inferior, que começou por ser amarelo, onde se fazia o anúncio das histórias a publicar em breve. Fui incumbido de desenhar essas apresentações.

Pensei em utilizar, em desenho, as pessoas da redacção do Tintin a anunciarem as novidades; assim, aparecia o Dinis Machado, o Mário Correia que fazia as rotulações das legendas, o Vasco Granja e às vezes eu próprio. O grande público não nos identificava, era uma graça entendida só entre nós, mas certa vez, o Vasco Granja informou-nos que tinha sido reconhecido na praia, por um miúdo. Viu-o com um Tintin na mão e associou o boneco a ele, e disse para a mãe: — Aquele Senhor é o do Tintin!

Passei então a identificar cada um que desenhava, mostrando os elementos da redacção e da direcção da revista.

Os meus modelos aí funcionavam com a sua própria identidade e na acção diária na Empresa. No fundo a apre- sentação das histórias passou a ser um pretexto para mostrar a redacção e direcção, o que rapidamente atingiu foi com-preendido pelo público leitor, curioso por auscultar como era o interior daquele ninho, de onde saía semanalmente o seu entretenimento preferido. Esse eco chegou-nos através de cartas e mesmo por contactos direitos de leitores mais próximos, que desejavam saber mais. Entusiasmei-me a mostrar numa dessas ilus-trações, como era mesmo a redacção e a direcção.

Na sala contígua à nossa funcionava a «Secção de Publicidade» dirigida pelo Vasco Granja, que passava continuamente a porta, com o pretexto de nos pedir, ao Mário Correia e a mim, desenhos de anúncios para as edições da editora, cartazes para as montras das 4 livrarias que a Bertrand mantinha na altura, mas com o objectivo de nos mostrar revistas franco belgas e espreitar os originais que tínhamos para publicação.

Com o Vasco Granja vinham por vezes umas suas colaboradoras, que ajudavam na redacção quando se tratava de concursos, como é o caso que foca esta ilustração.

Aproveitava as particularidades de cada um para as evidenciar exageradamente no desenho, como o conteúdo da pasta do Mário Correia, as gravatas exuberantes do Vasco Granja e os pacotes de revistas que este transportava debaixo do braço, ou ainda o facto do António Ramos, o Editor da Bertrand, estar frequentemente a falar pelo telefone para a «Lombard».

Mas um dos meus trabalhos na editora era criar anúncios dos livros editados em cada mês, para publicar nos jornais diários. O Mário Correia estava sobejamente ocupado em fazer as rotulações das legendas, que eu depois passei também a executar.

Junto exemplos dos anúncios. Estes anúncios eram criados com elementos das capas respectivas, de modo a que estas fossem identificadas pelos leitores, ao verem os livros nas montras, mas dando-lhe uma estrutura diferente, para também se evidenciarem nas páginas dos jornais. Uns eram dispostos com a composição inclinada, outros com um jogo de negativos, ou mesmo com seu inesperado arranjo gráfico. Eram sempre concebidos a preto e branco.

Chegámos a fazer montras ampliando o anúncio para o formato cartaz, numa chamada de atenção para os livros expostos.

No próximo artigo:

«As ilustrações «escondidas» em livros» das editoras.